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Anjo


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Meu bebê, desde o primeiro instante em que imaginei sua existência, você foi amado. Ainda nem sabíamos se você estava realmente a caminho, mas a emoção tomou conta da nossa família. Sua bisa, mesmo tão velhinha e cheia de fragilidades, me parabenizou só de ouvir falar na hipótese de que você estava por vir.. Ela sempre desejou te conhecer. Meu sonho era ver você nos braços dela.


Eu ainda esperava pelo resultado de um exame, acreditando que talvez você estivesse ali, escondidinho dentro de mim. O teste de farmácia dizia que não, mas meu coração insistia na esperança. Você já ocupava todos os meus pensamentos. Nunca imaginei que poderia desejar tanto ter você em meus braços. Pensava: venha no seu tempo, meu amor. A sua mamãe, tão acostumada a controlar tudo, estava aprendendo a esperar por você.


E então eu descobri. Eu estava grávida. A ficha demorou a cair. Em nove meses, se Deus permitisse, eu conheceria o maior amor da minha vida. De repente, eu era mãe. Uma mãe cheia de imperfeições, com ansiedades, medos, mas mãe. Foi quando percebi que a vida não acontece quando está tudo perfeito; ela simplesmente se impõe, com beleza e imperfeições.


Então os sintomas vieram. A fadiga, os enjoos, as aversões. Meu corpo mudava, e com cada mudança meu amor crescia. Eu sonhava com o dia em que minha barriga apareceria. Sempre tive aflição de barriga de grávida, mas agora eu sonhava com ela todas as noites.


Você era apenas uma sementinha, com poucas semanas, mas já transformava minha vida inteira. Cada mal-estar era uma prova de que você estava ali, crescendo do seu jeito.

Eu precisava de acolhimento, e pela primeira vez na vida, aceitei que precisava de ajuda. Pedi a Deus que me ensinasse a ser menos orgulhosa, que me trouxesse paz e direção.

Eu orava para que Deus formasse cada partezinha sua com perfeição. Ainda nem sabia se era só você ou se eram dois. Mas você já representava duas famílias inteiras, que te esperavam com um amor que você jamais poderia mensurar.


E então, sem aviso, veio a dor.


A dor silenciosa, solitária, quase incompreensível para quem está de fora. O mundo seguiu girando, e eu permaneci imóvel, quebrada por dentro. A vida é uma gangorra, às vezes estamos em cima, às vezes estamos embaixo. Eu estava no fundo.


Minha ansiedade voltou depois de tanto tempo. Os dias escureceram. Até o TOC, que tantas vezes me assustou, ficou pequeno diante do medo, do vazio, da despedida. Eu fiquei sem forças até para orar, mas pedi a Deus que tivesse misericórdia de mim, que me sustentasse como tantas vezes sustentou.


Você se foi tão rápido. Foram oito semanas com você. Oito semanas que mudaram quem eu sou. Sua vida breve foi celebrada todos os dias. E, apesar da dor, eu me sinto honrada por ter sido sua mãe, mesmo por pouco tempo.


Meu amor, você me transformou. Sou outra mulher agora. Mais preparada, mais consciente, mais madura para receber seu irmãozinho quando chegar o tempo dele. Você me ensinou que eu não tenho controle de nada. Me mostrou a importância de viver um dia de cada vez, de aceitar a vulnerabilidade, de desacelerar.


Com você, eu aprendi a cuidar de mim para cuidar de alguém. Aprendi que o corpo muda, que a rotina muda, que a vida muda. Aprendi que amor não depende de tempo, mas de profundidade.


Obrigada por ter existido. Por me escolher. Por ter me ensinado tanto em tão pouco tempo. Você me mostrou que eu não preciso ser uma super-heroína.

Você sempre será meu primeiro amor. E eu sempre serei sua mãe.

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